quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Desabafo de um amigo!

Abrindo exceção (talvez um importante precedente) ao objetivo deste blog, sinto-me na obrigação moral de reproduzir um belíssimo texto reflexivo redigido por um amigo. Trata-se de uma análise do ponto de vista econômico-social do estado de Caos vigente pela falha de uma das premissas fundamentais para o bom funcionamento de uma sociedade - a Segurança!

Texto redigido por Pedro Brazil:



Eu, até então, tinha feito comentários a respeito do estado de sítio que a sociedade baiana está vivendo, direcionados apenas ao questionamento da legalidade do movimento, suas verdadeiras causas, seus absurdos e suas consequências, como um cidadão que assinou o contrato social. Uma espécie de desabafo, por ver tamanha ousadia e ainda acompanhar, desalentado, o apoio de parte da sociedade baiana.
Quero agora refletir acerca do modelo econômico moderno e como a sociedade optou por (sobre) viver. Esse movimento paredista, particularmente, tem um poder imenso de propor uma discussão bem mais ampla, onde se inclui uma resposta para a seguinte pergunta: o que viemos fazer aqui, quando nascemos?

Acreditei sempre que o papel do Estado como o controlador social é assunto que - diante da afirmação de Thomas Hobbes que “o homem é o lobo do homem”, ratificada por Adam Smith “o homem é egoísta”, auto-interessado, e tirando teorias que vi como utópicas no tempo em que chegamos - fosse um assunto encerrado.
Mas talvez esse tenha sido o meu grande erro. Acreditar que uma nova forma de se comportar, que não economicamente, seja utopia. Uma sociedade onde seja possível o desenvolvimento social. Posso sim, duvidar da capacidade da sociedade capitalista curvar para outra trajetória que não seja a bisca incessante pela acumulação, mas não tenho o direito de desacreditar na efetividade e viabilidade de outro modo de se comportar socialmente.

Por que precisamos tanto da Polícia Militar?
A sociedade depositou na propriedade: o sucesso, a beleza, tudo que há de bom! O direito de propriedade da sociedade moderna não é mais um direito, é um dever! É preciso ter para ser! Mas esse consumismo desenfreado, vezes para garantir conforto, comodidade, vezes para se fazer destacar nas relações sociais, tem seus efeitos colaterais. Os impactos ambientais na natureza são sentidos e podem ser assunto de uma conversa a parte. Entretanto os impactos sociais são imensos também, e é disso que quero falar.

Teorizo - e aviso logo que sem nenhuma fundamentação - que cada real gasto em consumo supérfluo ativa a cobiça de pelo menos 5 pessoas.
Agora, pergunte a Bell Marques como ele consegue fazer seu cooper pela orla após ter comprado um avião a jato de 10 milhões de reais? Como Roberto Carlos consegue pisar no Brasil tendo comprado um iate de 45 milhões de reais?

Possível resposta: A sensação de segurança na força repressora do Estado.
Mas a sociedade borbulha por dentro. Tem-se a força repressora das ações, mas não se consegue controlar os pensamentos e os planos de ninguém. Imaginem, meus amigos, o que passa pela cabeça de, por exemplo, Eduardo, um cidadão criado num meio onde a bandidagem impera, que aprecia o chefe do tráfico (pois é quem detém o poder de transar com as mais gatinhas da comunidade), sem oportunidades, sem perspectivas, ao assistir a uma propaganda comercial que oferta, em liquidação, um Honda Civic por apenas 60 mil reais?? Não pensem apenas nesse cidadão, pensem também em um funcionário público, Marcelo, que recebe 3 mil reais por mês, mas carece de uma boa formação moral...será que ele estará propenso a cometer algum crime? O que pode segurar a cobiça desses dois homens? Certamente a força da polícia, juntamente com a certeza da punição.

O Natal é um momento de festa, São João também! Alguém já tentou se perguntar porque os crimes contra a propriedade crescem assustadoramente em épocas de festas? Será que Lucas, que não vai dar presente para a namorada por falta de dinheiro, já contabilizando umas 5 passagens pela polícia por furto, vai vacilar ao ver você passar na rua deserta falando ao celular?

O fato é que as pessoas acordam diariamente pensando em como ganhar dinheiro! Alguns pensando em como vai gastar o dinheiro. Esquecem de enxergar que vivemos num espaço só. Que não adianta estar montado numa Mercedes Benz conversível e estar rodeado de cidadãos que andam em transporte urbano lotado. Uma hora vai parar ao lado de um ônibus e vai tomar uma cusparada! A inveja é do ser humano. Alguns variam na sua intensidade.

Vejo, portanto, que o modelo atual redirecionou nosso objetivo de vida. Se um dia foi o de conviver em sociedade multiplicando laços, desfrutar da natureza, buscar conhecimento e auto-conhecimento, evolução espiritual, hoje se resume a sobreviver e, nos momentos possíveis, buscar ter mais e mais.

Saídas? Temos várias. Um outro sistema, não vislumbro. Mas se aumentarmos a preocupação com o outro, diminuirmos o consumo de luxo, acabarmos com propagandas e comerciais de TV, continuarmos a aumentar a oferta de políticas públicas de inclusão social, políticas e instituições de combate ao uso e tráfico de drogas, diminuirmos a sensação de impunidade e passarmos a estabelecer gradativamente uma cultura do anti-consumo, podemos um dia ter uma sociedade em paz com o orçamento de segurança que hoje temos.

Admito dificuldades na mudança. O sistema é programado para não permitir pensamento diferente. A opção de pensar diferente conduz à margem. Mas as saídas são possíveis. Para os mais adultos é preciso romper! Nos adolescentes temos o poder da mudança, estão fervendo! Nas crianças o segredo é educá-los com os novos valores.
Portanto, concluo afirmando que quanto maior for a diferença entre os que têm muito e os que têm pouco ou nada, maior será a necessidade de termos o braço repressor do Estado. E quando o braço repressor do Estado estiver em greve, lutando para ter um pouco mais, a rua fica reservada aos que vivem numa maior simplicidade.

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